sábado, 26 de dezembro de 2009

VENDA DE ANTIDEPRESSIVOS NO BRASIL CRESCE 45%

Venda de antidepressivos no Brasil cresce 44,8% em 4 anos, diz pesquisa

Transtornos mentais são a 3ª causa de afastamento do trabalho no país.

Crescimento econômico favorece consumo; especialista alerta sobre uso.

Ligia Guimarães

A venda de medicamentos antidepressivos e estabilizadores do humor cresceu 44,8% no Brasil em quatro anos, aponta levantamento realizado a pedido do G1 pela IMS Health, instituto de pesquisa que faz auditoria do mercado de medicamentos para a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

O volume de vendas desses medicamentos cresceu de R$ 674,7 milhões nos 12 meses acumulados até outubro de 2005 para R$ 976,9 milhões no mesmo recorte até outubro de 2009. As valores referentes a 2005 foram atualizados com base nos reajustes máximos permitidos pela Anvisa, que considera também a inflação do período.

O tatuador Cezar Marchetti cortou o uso de antidepressivos, mas manteve os calmantes. O mercado brasileiro de antidepressivos cresce acima da média mundial há pelo menos cinco anos, segundo Marcello Monteiro, diretor da IMS Health de linhas de negócios para América Latina e responsável pelo levantamento.

“O Brasil faz parte de um grupo de países classificados como “farmaemergentes”: Brasil, Rússia, Índia, Coréia, México e Turquia. Juntos, eles respondem por 50% do crescimento mundial do mercado de medicamentos”, afirma o executivo.

Dados da Previdência Social apontam que os transtornos mentais e comportamentais, como a depressão, são a terceira causa de afastamento do trabalho no Brasil. "Há uma série de doenças que a gente acha que são mais incapacitantes, mas o efeito da depressão sobre os brasileiros é muito grande", diz o médico psiquiatra Duílio Antero Camargo, do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas e coordenador da comissão técnica de saúde mental da Associação Nacional de Medicina do Trabalho (Anant).

Estímulo econômico

Segundo o diretor da IMS Health Marcello Monteiro, boas notícias no Brasil como o crescimento da economia, o aumento de renda dos trabalhadores e o envelhecimento da população estão entre os principais fatores que favorecem o aumento das ocorrências de tratamento dos “males urbanos” que, além de transtornos mentais e depressivos, incluem doenças como diabetes, hipertensão e obesidade.

Medicamentos chamados “crônicos”, específicos para tratar os males característicos do século XXI, subiram no ranking e ocupam sete posições na lista dos dez medicamentos mais vendidos no Brasil até outubro de 2009, dominado antigamente por analgésicos e antibióticos.

“O forte processo de urbanização pelo qual o Brasil ainda passa estimula o consumo desse tipo de medicamento: as taxas de crescimento são menores que na Europa, por exemplo, onde essa urbanização já acabou”, diz Monteiro.

Pressão profissional

Para o médico psiquiatra Duílio Antero Camargo, do Hospital das Clínicas, elementos presentes nas relações de trabalho contemporâneas como concorrência, acúmulo de tarefas, falta de apoio social e desemprego aumentam a incidência de transtornos mentais entre os brasileiros.

“Com as mudanças hoje em dia da organização do trabalho, muitas das causas da depressão estão ligadas aos relacionamentos diante do trabalho, como o estresse ocupacional ou relacionado ao mercado, desemprego e o mundo organizacional”, diz o psiquiatra.

Desde o vestibular

Foi a ansiedade para escolher a profissão na época do vestibular que levou o relações-públicas Pedro Azeredo Boschi, de 31 anos, a iniciar tratamento com medicamentos antidepressivos sob prescrição médica. "Chorava muito e estava desanimado", diz.

Hoje desempregado, ele diz que a pressão e a dificuldade para conseguir trabalho em Belo Horizonte (MG), onde mora, ainda influenciam na continuidade do tratamento. "Estou desempregado faz muito tempo e não estou conseguindo um emprego. É muita cobrança", explica.

Preconceito e benefícios

Para a jornalista Cátia Moraes, 49 anos, autora do livro "Eu Tomo Antidepressivo - Graças A Deus!", da editora Best Seller, a ampliação do acesso a esse tipo de medicamento é positiva, desde que haja recomendação e acompanhamento médico. Na opinião dela, o uso de antidepressivos ainda é alvo de resistência e preconceito.

Cátia teve a adolescência marcada pela experiência de ver o pai, "alegre e extrovertido", perder o emprego e a vontade de viver por conta de uma depressão severa. Hoje, ela lamenta a escassez e a ineficiência das opções de tratamento disponíveis na época.

"Fizemos na época todo tipo de tratamento: choque, psquiatria. Naquele tempo, nos anos 70, não se falava em depressão ou antidepressivo. Ele morreu quando eu tinha uns 15 anos, de um AVC", diz.

Há um preconceito em relação a esses medicamentos como não há em relação a outros. Se alguém faz tratamento para diabetes, problemas no coração, hipertensão, ninguém questiona"

Quando a própria Cátia começou a apresentar crises de ansiedade, angústia e taquicardia, no final dos anos 90, ela resistiu a iniciar o tratamento, mesmo com a recomendação de seu psquiatra.

"Foi se criando um bicho-papão. A gente via meu pai indo a médico e tomando aquele monte de remédio que não adiantava nada. Eu tinha preconceito (em relação a antidepressivos)", diz.

O uso dos medicamentos, garante, melhorou radicalmente sua qualidade de vida e lhe deu mais energia e foco. "Eu trabalhei a minha vida inteira abaixo da minha capacidade", avalia.

Peso no orçamento

O tatuador Cezar Augusto Marchetti, de 31 anos, começou em 2003 a fazer uso de antidepressivos e ansiolíticos para tratar sintomas de transtorno de ansiedade quando ainda morava com os pais e havia trancado um curso de Educação Física na faculdade em São Paulo (SP).

"Eram medicamentos caros, todos são", diz Cezar que, desde que foi morar sozinho passou a buscar os medicamentos no Sistema Único de Saúde (SUS), mediante a apresentação da receita médica.

"Gastava uns R$ 80, R$ 100 por mês. Sem condições", conta Marchetti, que desde o ano passado cortou os antidepressivos e manteve apenas o uso de calmantes algumas vezes por semana. "Parei porque os efeitos colaterais, como a tremedeira, me atrapalhavam no trabalho", diz.

O preço do Lexapro, que está entre os dez medicamentos mais vendidos no Brasil, segundo a IMS, varia de R$ 52,54 a R$ 69,40 em cinco drogarias de São Paulo consultadas pelo G1.

“Tristeza pontual não é doença e no entanto está sendo medicada”, diz o especialista"

"As primeiras vezes em que eu prescrevi antidepressivos, há cerca de 20 anos, alguns pacientes vieram para devolver a receita porque não dava para comprar, eram muito caros. Hoje eles são vendidos a preços acessíveis", conta o psiquiatra Duílio Antero Camargo, do Hospital das Clínicas.

Consumo exagerado

Na avaliação do vice-diretor do Hospital Dia do Instituto de Psquiatria do Hospital das Clínicas Elko Perissinotti, é preciso saber diferenciar um quadro de depressão clínica de tristezas pontuais naturais do ser humano antes de buscar apoio nos medicamentos.

“Remédio a gente deve tomar quando a gente está doente, e de preferência bastante doente. Não existe nenhum remédio no mundo para nenhuma doença que só tenha efeitos benéficos”, afirma.

Para Perissinotti, o uso de antidepressivos tem sido sobrevalorizado por pacientes e médicos, o que pode trazer riscos para a saúde e sequelas emocionais.

sábado, 3 de outubro de 2009

SUICIDALIDADE


De acordo com as estatísticas, pode-se traçar o perfil do suicida: Homem, com mais de 55 anos, morador de grandes cidades, AGNÓSTICO, socialmente isolado, fisicamente doente, sem antecedentes psiquiátricos e alcoólatra moderado. De saída, é possível algumas conclusões: a metrópole adoece psiquicamente o homem. O Agnosticismo, ou a doutrina que considera ser impossível ao homem conceber algo que vá além dos seus sentidos naturais, também é patogênico. O isolamento social, tão comum nas grandes cidades, também é fator de adoecimento. E o alcoolismo, que advém de um hábito incentivado pela mídia, conduz o homem a buscar o fim de sua própria existência. Urbanização, materialismo, autoclausura e dipsomania. Estes são os alvos de todos os que lutam pela vida. O perfil da pessoa que tenta o suicídio, mas não alcança o seu intento é: mulher, jovem, de boa saúde corporal, em situação de conflito evidente com o grupo familiar ou social mais imediato. Deste novo grupo, pode-se acrescentar novos alvos na luta contra a idéia de desistência da vida: o desajuste familiar e as injustiças sociais do mundo pós- moderno. Associam-se ao suicídio os seguintes fatores em ordem decrescente de importância: sexo masculino, idade avançada, viuvez, celibato ou divórcio, ausência de prole, residente em grande cidade, alto padrão de vida, crise econômica, consumo de álcool e droga, lar desfeito na infância e doença mental ou física. Outra surpresa: o alto padrão de vida. Isso quer dizer que mesmo o dinheiro não resolve os dramas psíquicos do ser humano. Os fatores considerados de maior segurança contra o perigo do suicídio são em ordem crescente: sexo feminino, juventude, baixa densidade populacional, religião, casamento, prole numerosa, baixo padrão de vida e situação de guerra. Aqui as surpresas são maiores. Em ciência o risco de suicídio chama-se suicidalidade. A suicidalidade é maior na opulência e menor na carência. Maior nos egoístas que nos pródigos. Maior no estilo de vida que não cogita da existência de Deus, do que nos que buscam com todas as forças, crer num Deus, infinitamente justo e bom. A melhor maneira de lutar contra as altas taxas de suicidalidade é incentivar a religiosidade e a solidariedade.
Flávio Mussa Tavares

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

DEZ MITOS, medos e dúvidas sobre a PSIQUIATRIA

Porque procurar um psiquiatra se meu problema é espiritual?

Somos seres compostos por uma alma, espírito e corpo. Logo, ainda que estejamos plenamente restaurados do ponto de vista espiritual, somos humanos e podemos ser acometidos por problemas que atingem nossa alma: depressão, medo, angústia, dentre outros. A conversão a fé cristã nos restaura espiritualmente, com uma nova natureza espiritual viva para Deus, entretanto, não apaga instantaneamente nossos traumas do passado, personalidade, conflitos familiares e dificuldades emocionais. Um psiquiatra ou psicólogo pode nos ajudar a melhorar mais rapidamente destes problemas.

Mas, psiquiatra não é médico de louco?

De fato, o profissional mais qualificado para tratar casos de loucura é o psiquiatra. Entretanto, a psiquiatria é uma especialidade médica ampla, tendo várias áreas de atuação: depressão, ansiedades, fobias, transtornos do sono, transtorno bipolar, distúrbios da sexualidade, transtornos alimentares, demências e dependência química, dentre outros transtornos. Além disso, a psiquiatria é uma especialidade médica como qualquer outra, amparada por estudos clínicos universalmente aceitos e praticados.
Entretanto, muitas pessoas por preconceito deixam de consultar um psiquiatra, fazendo com que doenças de baixa gravidade se tornem doenças graves, prejudicando a recuperação futura do paciente.

Psiquiatras dopam as pessoas com remédio.

No início do uso das medicações em Psiquiatria alguns fármacos tinham elevado potencial sedativo e grande número de efeitos colaterais. Com os avanços da medicina e melhor conhecimento dos transtornos mentais foi possível realizar tratamento com menor número de medicações e efeitos colaterais. Entretanto, todos os medicamentos podem apresentar efeitos adversos, tornando a consulta com um especialista fundamental.

As medicações psiquiátricas viciam e geram dependência.

Em torno de 80% dos transtornos mentais apresentam manutenção da cura após a suspensão das medicações. Entretanto, alguns transtornos mentais podem demandar o uso contínuo das mesmas. Neste caso, é importante lembrar que não tomar as medicações pode trazer prejuízos em várias áreas no dia a dia do paciente: relacionamentos, trabalho, família, finanças, etc. Importante lembrar que aceitamos com muita facilidade o uso crônico de medicações para hipertensão, gastrite, diabetes, dores, etc., mas, não aceitamos o uso crônico de medicações psiquiátricas, mesmo quando elas trazem grandes melhorias em nossa qualidade de vida.

Como confiar em um psiquiatra se ele não comprova as doenças com exames?

A origem dos transtornos mentais é complexa: fatores genéticos geram uma predisposição que pode ou não evoluir para um transtorno mental, dependendo da personalidade, traumas, conflitos, qualidade de vida, e outros pontos do funcionamento mental do paciente. Essas alterações genéticas e no comportamento geral do paciente não são evidenciadas em exames (tomografia, ressonância e exames de sangue) tornando o diagnóstico psiquiátrico altamente dependente de uma boa entrevista clínica. Eventualmente, um psiquiatra pode solicitar exames por suspeitar que doenças orgânicas estejam causando sintomas psiquiátricos, ou como ajuda no diagnóstico psiquiátrico.

Os psiquiatras mudam e confundem a mente das pessoas.

O objetivo do tratamento psiquiátrico é ajudar as pessoas a terem alívio e melhora, ainda que parcial, no seu sofrimento e funcionamento mental. O psiquiatra não interfere nos gostos e preferências dos pacientes, respeitando profissionalmente suas preferências sociais, espirituais, ocupacionais, sexuais, ainda que possa fornecer auxílio e orientações pertinentes a estas áreas.

Mas tratar com um psiquiatra não é falta de fé ou não acreditar que Deus pode curar?

Creio, particularmente, que Deus pode curar as pessoas. Esta cura pode ocorrer de forma direta e sobrenatural: o chamado milagre. Entretanto, Deus concede sabedoria aos médicos e a cura pode ocorrer por meio da ação deles. A ação de Deus na vida de cada ser humano é altamente particular, e com um propósito específico para cada um, fazendo com que experiências de alguns não sejam experiências de todos.

Os psiquiatras são estranhos e misteriosos, não explicam as doenças aos pacientes.
Os psiquiatras geralmente estão abertos aos pacientes e a tirar dúvidas, como qualquer outro médico. Às vezes, algumas informações não são transmitidas por não ser o melhor momento e por gerar ansiedade nos pacientes. Além disso, em alguns casos, o psiquiatra recorre a família do paciente, para que possa formar uma rede forte em sua recuperação.

Psiquiatras gostam de internar pacientes em hospícios por longo tempo e até para a vida toda.

Infelizmente, por longo tempo, os pacientes psiquiátricos foram internados em condições precárias em hospícios e casas de repouso, excluídos da sociedade e da família. Tal prática foi mudada por um movimento mundial, chamado Anti-manicomial, que denunciava exageros e defendia um tratamento psiquiátrico sem exclusão social e com humanização. Há leis que defendem os pacientes de tais práticas. Entretanto, os psiquiatras podem indicar uma internação eventualmente, como qualquer outro médico, dependendo da gravidade de cada caso, proporcionando um convívio social e familiar ao paciente tão logo quanto possível.

O tratamento psiquiátrico é muito caro.

Uma pessoa com transtorno mental pode ter grandes prejuízos em seu trabalho, relacionamentos, família e espiritualidade. Estes prejuízos podem trazer outras grandes conseqüências: perdas financeiras, perda de emprego, conflitos conjugais e em relacionamentos em geral. Logo, os benefícios de um tratamento efetivo superam sobremaneira os custos de tratamento

sábado, 15 de agosto de 2009

O diagnóstico clínico da depressão

Clínico diagnostica apenas 47% dos casos de depressão, mostra estudo

JULLIANE SILVEIRAda Folha de S..Paulo

Uma meta-análise de 41 estudos de dez países (envolvendo mais de 50 mil pacientes) mostra que somente 47% dos casos de depressão são diagnosticados no atendimento primário (durante uma consulta com um clínico-geral, por exemplo) e que há falso diagnóstico da doença em 20% dos casos.

O estudo, publicado na edição on-line do "Lancet", avaliou trabalhos desenvolvidos em países europeus, além de nos EUA, no Canadá e na Austrália. "Essa questão [do diagnóstico] tem gerado um debate duplo. Existem afirmações de que a depressão é subdiagnosticada, e há a posição contrária -segundo a qual a depressão é exageradamente diagnosticada pelo fato de os pacientes tenderem a se identificar como deprimidos e os clínicos do atendimento primário aceitarem isso", afirma o psiquiatra Marco Antônio Brasil, integrante do conselho consultivo da Associação Brasileira de Psiquiatria.

O número de afetados pela depressão no Brasil segue dados mundiais: 12% dos homens e 20% das mulheres terão a doença em alguma fase da vida. Em geral, nos serviços de atenção primária a incidência de depressão varia de 10% a 15% dos pacientes avaliados. "É uma taxa muito elevada, um problema de saúde pública. Em ambulatórios de cardiologia, os índices sobem para 20%", diz o psiquiatra Renério Fráguas Júnior, supervisor do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo.

O falso diagnóstico pode ocorrer quando o paciente apresenta sintomas facilmente confundíveis com depressão -caso de uma tristeza profunda por uma perda importante ou estresse. Isso pode levar a tratamentos desnecessários.

"Quando há treinamento, pode ocorrer excesso de diagnóstico. Mas mesmo pacientes [sem a doença] com alguns sintomas depressivos podem ter a qualidade de vida comprometida, com mais dificuldade para tomar decisões ou para se concentrar, por exemplo. Isso não quer dizer que tenham de tomar remédio, mas que eles precisam ser cuidados de alguma forma", pondera o psiquiatra.

Subdiagnóstico

No entanto, de acordo com os especialistas, o subdiagnóstico é muito recorrente e mais preocupante. Para Geraldo Possendoro, psiquiatra e professor de medicina comportamental da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), a sobrecarga do serviço público também contribui para dificultar o diagnóstico precoce. "A consulta costuma ser muito rápida, o que faz com que o clínico foque somente na área dele", diz.

Segundo Brasil, é necessária a formação dos médicos generalistas para que o diagnóstico de depressão seja feito mais precocemente. "O deprimido não procura um psiquiatra, até por preconceito. Ele vai ao clínico, ao neurologista. .."

O suporte de um psiquiatra no atendimento primário pode ser necessário para que os clínicos aprendam a identificar sintomas de depressão. No entanto, a formação somente teórica não é suficiente para capacitar os médicos generalistas. "Além disso, é preciso dar supervisão, discutir os casos reais desses pacientes. É preciso um psiquiatra para discutir casos de dúvida", acrescenta Brasil.

sábado, 30 de maio de 2009


O poeta Ferreira Gullar, pai de dois esquizofrênicos, levanta uma das maiores controvérsias da psiquiatria: o que fazer com doentes mentais em estado grave?

CRISTIANE SEGATTO, IVAN MARTINS, ANDRES VERA, MARCELA BUSCATO E MARIANA SANCHES


REVSTA ÉPOCA 30/05/2009 (link no fim)

INTERNAÇÃO

Ele entrava em surto
E o pai o levava de
carro para
a clínica
ali no Humaitá numa
tarde atravessada
de brisas e falou
(depois de meses
trancado no
fundo escuro de
sua alma)
pai,
o vento no rosto
é sonho, sabia?

Quando o escritor Ferreira Gullar publicou em 1999 o poema “Internação” (acima), já era um veterano na convivência com doentes mentais. Quem fez a observação sobre o vento foi Paulo, seu filho mais velho, que hoje tem 50 anos. Ele sofre de esquizofrenia, doença caracterizada, entre outras coisas, por dificuldade em distinguir o real do imaginado. Desde os anos 70, Gullar tenta administrar a moléstia. Fazia o mesmo com Marcos, o filho dois anos mais jovem, que também tinha esquizofrenia e morreu de cirrose hepática em 1992. Remédios modernos permitem que pessoas como Paulo passem longos períodos em estado praticamente normal. Sem alucinações, sem agitação, sem agressividade. Mas o tratamento só funciona se o doente tomar os medicamentos antipsicóticos todos os dias e na dose certa. Isso nem sempre acontece. O resultado são os surtos, quando o paciente se torna quase incontrolável.
Pode cometer suicídio ou agredir quem está por perto. Nesses momentos, esses doentes costumam precisar de internação. “Dói ter de internar um filho”, diz Gullar, hoje com 78 anos. “Às vezes, não há outro jeito.”
No Brasil, estima-se que haja 17 milhões de pessoas com algum transtorno mental grave – como esquizofrenia, depressão, transtorno bipolar, transtorno obsessivo-compulsivo. Em algum momento, eles podem precisar de um hospital psiquiátrico. Encontrar uma vaga, porém, tornou-se uma tarefa difícil.
Nos últimos 20 anos, quase 70% dos leitos psiquiátricos do país foram fechados. Sem conseguir quem os ajude a cuidar dos doentes, pais e irmãos afirmam ter várias dimensões de sua vida pessoal comprometidas, dos compromissos de trabalho às amizades. É o que revela uma pesquisa feita em 2006 em Minas Gerais com 150 famílias com pessoas atendidas nos Centros de Referência em Saúde Mental. Em muitos casos, os doentes em surto fogem sem deixar rastro. Podem acabar embaixo dos viadutos. O aumento da população de rua nas grandes cidades não é fruto exclusivo da desigualdade social. Uma pesquisa feita em 1999 com moradores de rua em Juiz de Fora conclui que 10% deles eram psicóticos sem assistência.
“As famílias, principalmente as que não têm recursos, não têm mais onde pôr seus filhos”, diz Gullar. “Eles viram mendigos loucos, mendigos delirantes que podem agredir alguém. O Ministério da Saúde tem de olhar para isso.” Gullar decidiu expor publicamente um problema que não é só seu. Nas últimas semanas, escreveu três artigos sobre o assunto em sua coluna no jornal Folha de S.Paulo. “Não pretendo liderar movimento algum. Sou um cidadão que tem uma tribuna e pode falar sobre o que está errado.”
Ele afirmou, no primeiro texto, que a campanha contra a internação de doentes mentais é uma forma de demagogia. Foi o suficiente para fazer eclodir uma controvérsia latente. Nos dias seguintes, dezenas de leitores enviaram cartas ao jornal. Representavam dois grupos. O primeiro, em apoio a Gullar, aponta as razões fisiológicas da doença mental e considera que a internação é um instrumento necessário nos momentos de surto.
O segundo, contra ele, afirma que os doentes devem ser atendidos em Centros de Atenção Psicossocial (Caps). Nesses locais, o paciente recebe medicação e acompanhamento semanal. A ideia é atendê-lo sem retirá-lo do convívio da família e da comunidade. Para esse grupo, mesmo nos momentos de crise, o doente deve ser atendido nos Caps. Ele passaria alguns dias internado na própria instituição (ou em hospitais comuns, com alas psiquiátricas) e depois voltaria para casa. “O hospital é um lugar de isolamento, funciona como uma prisão. As pessoas vão e não voltam”, diz Humberto Verona, presidente do Conselho Federal de Psicologia. “Algumas famílias querem que a pessoa fique internada. É a ideia da instituição como depósito.”
Gullar se ofende com comentários como esse, que ouve desde o final dos anos 80, quando a reforma psiquiátrica que levou à situação atual começou a ser discutida no Brasil. “Essas pessoas não sabem o que é conviver com esquizofrênicos, que muitas vezes ameaçam se matar ou matar alguém. Elas têm a audácia de fingir que amam mais a meus filhos do que eu.”


“Ninguém aguenta uma pessoa delirante dentro de casa”

Um dos maiores críticos da falta de vagas para internação psiquiátrica, o poeta Ferreira Gullar conta a ÉPOCA a experiência de ter convivido com dois filhos esquizofrênicos - o que ainda está vivo mora hoje num sítio em Pernambuco.

Cristiane Segatto

SEM OPÇÕES

Ferreira Gullar diz que as famílias sem recursos não têm onde pôr filhos com doenças mentaisO poeta Ferreira Gullar, 78 anos, teve dois filhos com esquizofrenia. Paulo, 50 anos, vive num sítio em Pernambuco há cinco. Marcos, que tinha um quadro mais leve da doença, morreu em 1992, de cirrose hepática. Recentemente, Gullar escreveu três artigos no jornal Folha de S. Paulo sobre a falta de vagas para internação psiquiátrica. A reação dos leitores chamou atenção para uma das maiores controvérsias da psiquiatria: o que fazer com doentes mentais em estado grave? Gullar concedeu a seguinte entrevista a ÉPOCA em seu apartamento em Copacabana, no Rio de Janeiro (confira ao final desta página um vídeo com trechos da conversa).

ÉPOCA - A lei federal 10.216, aprovada em 2001, não proíbe a internação de pacientes em hospitais psiquiátricos, mas estimulou a redução de leitos. Por que decidiu falar sobre essa lei agora?
Ferreira Gullar - Antes da aprovação da lei, soube do que consistia o primeiro projeto. Para internar uma pessoa, a família precisaria pedir autorização de um juiz. Felizmente isso foi retirado do texto final. Imagine o que é ter em casa um garoto em estado delirante - às vezes falando sem parar da noite até o dia seguinte. Os pais tentam dar remédio, tentam conversar e nada funciona. Nessa situação, o único recurso é internar. Você sente que a pessoa está saindo do controle e pode fazer uma loucura qualquer. Imagine ter de aguardar autorização de um juiz para internar um paciente numa situação de emergência. Que juiz? Aquele que nunca encontramos na justiça eficiente que temos? Imagine o desastre que isso seria.


ÉPOCA - Mas por que decidiu escrever neste momento?

Gullar - Li notícias recentes sobre o aumento de doentes mentais na população de rua. Eu já previa que isso ia acontecer diante da restrição do número de hospitais e do período de internação. Como é possível estabelecer um período de internação, determinar que um paciente psiquiátrico esteja curado dentro de determinado tempo? Quem não tem dinheiro para colocar o filho numa clínica particular fica com ele em casa até quando suportar. Muitas vezes o doente foge. Quantas vezes isso aconteceu comigo... Ele foge, vai para rua sem rumo. Ninguém sabe para onde vai.


ÉPOCA - O doente precisa ficar vigiado dentro de casa?

Gullar - Ninguém aguenta uma pessoa em estado de delírio dentro de casa. Só se ninguém trabalhar, todo mundo ficar em volta do doente. E se for uma pessoa agressiva? Tem que internar. Nenhum pai e nenhuma mãe internam seus filhos contentes da vida, achando que se livraram. Não estou dizendo que a lei foi feita para perseguir as pessoas. Não vou imaginar uma coisa dessas. Ela foi feita com boa intenção. Mas de boa intenção o inferno está cheio.


ÉPOCA - O senhor acha que a internação em hospitais psiquiátricos é o melhor tratamento?

Gullar - Ninguém é a favor de manicômio ou de encerrar uma pessoa pelo resto da vida. Isso não existe há muito tempo. Mas hoje as famílias sem recursos não têm onde pôr seus filhos. Eles vão para a rua. São mendigos loucos, mendigos delirantes. Podem agredir alguém. É imprevisível o que pode acontecer. O Ministério da Saúde tem de olhar isso. O hospital-dia é uma boa coisa. Mas para o doente ir para o hospital-dia ele tem que querer ir. Quando entra em surto, é evidente que não vai querer ir para o hospital-dia. Dizer que os doentes serão encarcerados é terrorismo.


ÉPOCA - Qual a sua opinião sobre a visão do movimento de luta antimanicomial?

Gullar - Esse pessoal não diz explicitamente, mas eu sei que para eles não existe doença mental. Por que falam em psiquiatria democrática? Existe urologia democrática? A psiquiatria democrática pressupõe que as pessoas internam seus parentes para cercear a liberdade deles. Segundo essa linha, o cara não é doido. Ele é um dissidente. Isso vem da época das drogas, da época dos Beatles, da época em que as pessoas diziam “tu tá pinel”. O que era isso? A classe média cheirava cocaína e ia parar no Pinel. Não eram doidos. Mas, levada a uma overdose, a pessoa pode entrar num estado de delírio. Esse pessoal acha que a máfia de branco cerceia a liberdade das pessoas. Pessoas que são dissidentes da sociedade burguesa. A psiquiatria democrática considera que a sociedade é que é doente e reprime aqueles que discordam dela.


ÉPOCA - Por que o sr. diz que isso é um marxismo equivocado?

Gullar - A raiz ideológica da psiquiatria democrática é a ideia de que não existe doença. A sociedade é que é culpada porque é burguesa. Quando eu estava exilado em Buenos Aires, nos anos 70, fui conversar com os médicos no hospital onde meu filho Paulo (hoje com 50 anos) havia sido internado depois de um surto. Uma médica veio conversar comigo e disse que o problema não era do meu filho. Era da família e da sociedade. Disse para ela: então me interna.


ÉPOCA - Paulo estava com você no exílio?

Gullar - Nessa época, sim. Um dia ele teve um surto e sumiu. Foi encontrado em estado totalmente delirante e foi internado. A médica chamou a mim e a minha mulher para conversar. Eu disse: coração adoece, rim adoece sem que a sociedade seja culpada de nada. O cérebro é o único órgão que não adoece por si? A sra. não acha que uma pessoa pode nascer com uma deficiência fisiológica no cérebro? O que está por trás de tudo isso é uma visão equivocada.


ÉPOCA - Quando seus filhos receberam o diagnóstico de esquizofrenia?

Gullar - Os dois começaram a falar disparates e a se comportar de maneira anormal. Isso se manifestou quando tinham 15 ou 16 anos. A doença foi precipitada pela droga. Era um período que cheirar cocaína, fumar maconha e consumir LSD estavam na moda. Surgiram anormalidades, mas eu não fiz nada. Atribuía o comportamento deles às drogas.

sábado, 28 de março de 2009

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sexta-feira, 13 de março de 2009

A PARTE DIVINA DO CÉREBRO, de Matthew Alper


A maioria das pessoas se preocupa em saber se Deus existe e como ele é. Matthew Alper propõe, em A parte divina do cérebro, um questionamento revolucionário: por que Deus existe?
A conclusão é inusitada e polêmica. Com uma lógica impecável, o autor demonstra que a espiritualidade nada mais é do que um recurso evolutivo que permitiu à espécie humana lidar com seu maior medo: a morte.
A parte divina do cérebro recebeu elogios de cientistas de renome internacional, como E. Fuller Torry, a quem o Washington Post qualificou como “o psiquiatra mais famoso dos Estados Unidos”, e Arnold Sadwin, ex-chefe de neuropsiquiatria da Universidade da Pensilvânia.

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

A LOUCURA EM HORÁRIO NOBRE

por Fabiane Leite, Seção: Saúde mental 15:00:11.

“Aqui louco varrido não vai para debaixo do tapete”. A novela das oito havia começado e, de relance, enxerguei a frase escrita em uma plaquinha na porta do “consultório” do personagem de Stênio Garcia, o psiquiatra "Doutor Castanho". Puxa, a reforma psiquiátrica em horário nobre? Quis saber mais.
Glória Perez (a autora de Caminhos das Índias) é hábil no merchandising social. Assim, trouxe para a novela a esquizofrenia, e os problemas dos doentes e das famílias de pessoas que convivem com a doença fora dos hospícios. Vinte anos depois do início do movimento pela reforma no País, chegou a sua casa o debate sobre substituição das internações em grandes hospitais psiquiátricos pelo atendimento –e acolhimento - dos doentes em Centros de Atenção Psicossocial, hospitais dias, e pela família. Para integrantes da luta contra os manicômios, mais um passo contra os estigma que atormenta as pessoas que vivem com transtornos mentais.
O Núcleo de Saúde conversou com a psiquiatra Patrícia Schmid, de 38 anos, a consultora oficial de Glória para o “núcleo” de personagens com esquizofrenia. Ela é vice-diretora do Instituto Municipal Nise da Silveira, no Rio de Janeiro, que leva o nome da psiquiatra brasileira que revolucionou ao utilizar a arte como método terapêutico. Veja trechos da entrevista, ilustrada com uma obra de Carlos Pertuis, da mostra virtual do Museu de Imagens do Inconsciente, organizado por Nise.
Como este tema foi parar em uma novela?
Patrícia Schimid- A Glória é prima de uma colega nossa, a Sônia Ferrante, organizadora do evento Loucos por Música, e lá ela conheceu o grupo de música Harmonia Enlouquece. A partir daí decidiu que a campanha social da novela seria a favor dessas pessoas (o Harmonia Enlouquece é um grupo musical que nasceu em um centro psiquiátrico, muito festejado pela crítica. Conheça o grupo).
E como você se tornou consultora?
Patrícia - O meu primeiro contato foi com a pesquisadora da novela, Giovana Manfredi. Como vice-diretora do instituto, começamos a conversar e eu me encantei com a proposta, pois um dos temas que mais estudo é o estigma contra pessoas que vivem com doença mental. Achei a ideia fenomenal e iniciei um trabalho totalmente voluntário. A equipe da novela tem visitado diferentes institutos de saúde mental e CAPs (Centros de Atenção Psicossocial, que devem atender o doente na comunidade). Além disto, durante a preparação, levamos colegas e pacientes ao Projac (local de gravação da novela).
E qual foi o impacto até agora?
Um dos pacientes, aquele que apareceu na novela pintando um quadro, acabou de entrar na minha sala para contar. Ele é realmente um artista e foi reconhecido e festejado até no ponto de ônibus. Isto tem um efeito na autoestima. Já no salão de beleza que eu frequento, a manicure comentou: “não pensei que louco poderia trabalhar”. A novela faz uma construção muito sutil sobre a realidade da doença mental. Por exemplo, coloca a diferença entre o psicótico (os personagens Ademir, de Sidney Santiago, e Tarso, de Bruno Gagliasso, que têm esquizofrenia) e o psicopata. Sim, há um psicopata na novela, que é a Ivone (Letícia Sabatella). Há ainda um “pitbull” (um personagem que parte para a pancadaria por qualquer coisa). O que a novela mostra é que há vários tipos de violência e que o que tratável é a do Ademir e do Tarso, a esquizofrenia. O que ele faz é porque está doente.
No ano passado houve um intenso debate no meio médico sobre os efeitos da reforma depois de reportagem que apontou suposto aumento das mortes de doentes mentais após o País adotar uma política de redução de leitos psiquiátricos.
Patrícia - O que ocorre é que começamos a tratar esses doentes . É como a dengue, o problema não existia até começarmos a notificar. Começamos a notificar porque os doentes saíram das instituições. Antes eles eram um zero, em tudo, não existiam.
Qual o impacto da novela para a luta contra os manicômios?
Há um artigo recente no site do Banco Interamericano de Desenvolvimento que mostra o impacto das novelas brasileiras na taxa de divórcios. Eu vou fazer meu doutorado sobre o impacto da novela sobre o estigma em relação as pessoas com doença mental. Não é qualquer experiência o que está acontecendo. Todos os estudos sobre estigma mostram que ele é propagado principalmente pelos locadores de imóveis, que se recusam a alugar para pessoas com doenças mentais, policiais, pela atribuição do comportamento violento, e pela mídia. As novelas no Brasil são vistas por 50 milhões de pessoas, vão ao interiorzão, até pessoas que não têm noção de que é possível conviver com a doença mental. Todo mundo tem medo de ficar louco, por isto as pessoas têm medo de quem tem doença mental. Mas quando o personagem do Bruno Gagliasso, com aqueles olhos azuis, surtar, aí vai bombar. A novela está mostrando que a loucura traz muito sofrimento. E as pessoas saberem que o louco sofre é muito importante.

Fonte:
http://blog.estadao.com.br/blog/fabianeleite/?title=a_loucura_em_horario_nobre&more=1&c=1&tb=1&pb=1 (em 27/02/2009)

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Psiquiatria e Vida

Apresento-me como psiquiatra!

Este blog em breve terá publicações para atender ao público em geral.

No momento estou preparando algumas postagens iniciais.

Aguardem!